GONÇALO BYRNE ARQUITECTOS
 

Fátima, Portugal

1998

 
 

Photos: José Manuel Costa Alves

Fátima Large Covered Area for Assemblies

The city of Fátima is characterised, in part, by the divergence between the “city of the Sanctuary” and the chaotic and violent process of sedimentation around it of the “civil city.” Some measures, such as the consolidation of a new urban front to the West, the reinforcement of accessibility and parking on the same side and the concealment of D. José Alves Correia da Silva avenue, will allow an urban regeneration that complements the option of implementing the new large covered area for assemblies space (GECA in Portuguese) between Pio XII square and the Pastoral Center.

This new territorial breath of the civil city will reinforce the sense of progressive and hierarchical approach of the pilgrim on foot, or motorized, when approaching the Paulo VI Center, converging in the new churchyard, not only of GECA but also of the enclosure. This churchyard must allow the contiguous perception of the GECA and the Sanctuary, ritualizing the approach and the ultimate discovery of the “emptiness - full,” without breaking the dimension that currently exists between the Paulo VI Center and the Basilica. These delimit the “center” or the “void” to which José Mattoso refers when characterising the sacred spaces of exception that were born from an extraordinary “manifestation” of the sacred, as opposed to a parish church or cathedral. The “Sanctuary” is the “materialisation of memory” and “has as a reference a moment, an experience, an epiphany.” According to Mattoso, sanctuaries are marks of the sacred in the space of men, promises of revelation, invitations to seek an extraordinary experience at the cost of a break with daily life, feed for thought during the journey undertaken by the attraction of the mystery; appeal to overcome a monotonous and gray life. This characterisation of empty space that the historian associates with the culmination of the “pilgrimage,” because “what he expects is that the manifestation of God is revealed in some unpredictable and surprising way,” is essential to the sanctuary’s experience (or of its “call”) “because if it is surrounded by a void, its character of an epiphany is accentuated.”

The new covered assembly space creates a new geography or landscape, in which the coverage is traversable. In this geography, three elements of the ecclesiastic architectural tradition stand out: the staircase, the tower, and the complementary cross. The union of these three elements denounces the width of the huge nave but also the presence of the Sanctuary that the pilgrim discovers in a final effort ascending the staircase. The approach from east, coming from the Chapel of the Apparitions, is immediately captured by the great descending door that contradicts its great ascending volume and revealing the processional succession of the atria of the secondary chapels and of the reconciliation, of the great transversal atrium whose “dome” announces the dimension of the large nave as a huge sky that accompanies the involvement of the presbytery.

 
 

Português

A cidade de Fátima caracteriza-se, em parte, pela divergência existente entre a “cidade do Santuário” e o processo caótico e violento da sedimentação, à sua volta, da “cidade civil”. Algumas medidas, como a consolidação de uma nova frente urbana a Poente, o reforço da acessibilidade e estacionamento desse mesmo lado e o enterramento da Av. D. José Alves Correia da Silva, permitirão uma regeneração urbana que complementa a opção de se implantar o novo espaço de assembleia coberto (GECA) entre a Praça Pio XII e o Centro Pastoral.

Este novo fôlego territorial da cidade civil reforçará o sentido de aproximação progressiva e hierarquizada do peregrino a pé, ou motorizado, que se aproxima do Centro Paulo VI, convergindo no novo adro, não apenas do GECA, mas também do recinto. Este adro deve permitir a percepção contígua do GECA e do Santuário, ritualizando a aproximação e descoberta derradeira do “vazio – pleno”, sem romper a dimensão actualmente existente entre o Centro Paulo VI e a Basílica, quer na continuidade visual, quer na continuidade processional da descoberta ascensional sem perca de escala.

A Basílica e o Centro Paulo VI limitam a Nordeste e Sudoeste um recinto com cerca de 600 metros segundo o eixo principal e 150 metros de largura. É este o “centro” ou o “vazio” a que se refere José Mattoso ao caracterizar os espaços sacros de excepção que nasceram de uma “manifestação” extraordinária do sagrado, por oposição a uma igreja paroquial ou catedral. O “Santuário” é a “materialização da memória” e “tem como referência um momento, uma experiência, uma epifania”.

De acordo com Mattoso, os santuários são marcas do sagrado no espaço dos homens, promessas de revelação, convites à procura de uma vivência extraordinária à custa de uma ruptura com o quotidiano, alimento durante a caminhada empreendida pela atracção do mistério, apelo à superação de uma vida monótona e cinzenta. Esta caracterização de espaço  vazio que o historiador associa ao culminar da “peregrinação”, porque  (o peregrino) “o que espera é que a manifestação de Deus se revista de alguma forma imprevisível e surpreendente”, é essencial à própria experiência  do Santuário  (ou da sua “chamada”) “porque se for rodeado por um vazio, o seu carácter epifânico acentua-se”. Esta dimensão ainda existe em Fátima, ao percorrer-se o recinto à grande escala do céu aberto ou da abóboda celeste omnipresente, preenchendo esse tal grande vazio de profundo sentido epifânico.

O novo espaço de assembleia coberto inclui nos seus objectivos programáticos outros pressupostos que resultam  do relacionamento da sua dimensão com a escala e as características  morfológicas do sítio e do Santuário na sua totalidade, em que a proposta arquitectónica modela o terreno existente (que, outrora, foi artificialmente modulado) criando uma nova geografia ou paisagem, em que a cobertura é percorrível.

Nesta geografia, destacam-se três elementos fortemente identificáveis na tradição arquitectónica eclesial: a escadaria, a torre volumétrica e vítrea e a cruz complanar. A união destes três elementos denunciam a largura da enorme nave do GECA mas denunciam igualmente a presença do Santuário que o peregrino descobre num derradeiro esforço de ascensão da escadaria.

 A aproximação da nascente, proveniente da Capela das Aparições é imediatamente captada pela grande porta descendente que contraria o seu grande volume ascendente e revelando a sucessão processional dos átrios das capelas secundárias e da reconciliação, do grande átrio transversal cuja “abóboda” anuncia a dimensão da grande nave do GECA como um enorme céu que acompanha o envolvimento do presbitério.

A visibilidade do edifício revela-se, sobretudo, dinâmica e processional, que se vai desenrolando na vivência de sucessivas revelações, “ocultando” para “revelar”. É esta a diferença referida por José Mattoso, entre uma igreja paroquial ou uma catedral e o espaço dos santuários, que nasceram de uma “manifestação extraordinária do sagrado” que está no centro da “chamada” do peregrino e da sua caminhada. Da peregrinação à procissão  “como quem atravessa o tempo das provas para ser digno da iniciação ao penetrar no lugar escolhido por Deus para se revelar” novamente citando Mattoso.